sexta-feira, 23 de setembro de 2011 | By: Rodrigo Pael

Churrasquinho vagabundo

Ainda era adolescente quando percebi minha predileção pelos churrasquinhos vendidos nas ruas, o popular churrasquinho de gato. Lembro que uma pequena padaria perto da casa de meus pais, em Campo Grande-MS, foi o estabelecimento que me apresentou essa iguaria. Já quando morava em São Paulo, por muitas vezes, a carnezinha assada no palito era minha única refeição noturna. Com dois reais já estava alimentado. O cardápio não parecia dos melhores, mas a vista era fantástica: as luzes da Avenida Paulista.

Em uma determinada oportunidade, estava em Cabo Frio, no Rio de Janeiro, passando as férias com minha família, quando avistei uma pequena churrasqueira com churrasquinho de gato assando, debaixo de um sol escaldante. Escondido de meu irmão e de minha cunhada, comprei um espetinho, já que o Ricardo e a Carol são muito preocupados com questões sanitárias. Quando dei por mim, trombei com meu irmão. Com receio das críticas, falei sem graça: “Estava com fome, fui comprar um churrasquinho vagabundo”. Ele: “Churrasquinho vagabundo?... Hum... São os melhores”.
Estava batizado: churrasquinho vagabundo.

Tarde da noite em Brasília, eu e minha namorada estávamos famintos e em busca de algo para comer quando nos deparamos com um estabelecimento peculiar. Um toldo grande e velho cobria uma calçada rachada e uma fachada sem manutenção. Mesas e cadeiras de plástico, além de uma churrasqueira típica completavam o ambiente, que estava apropriado para propiciar um delicioso “churrasquinho vagabundo”.
No comércio, só havia isso. Era possível avistar que dentro da casa havia uma bagunça, engradados, freezers e só. Imaginem um local administrado por um homem separado da mulher e desleixado. Esse é o aspecto do local. Já o churrasquinho, huummmm! Feijão tropeiro, mandioquinha, vinagrete e molho shoyu para derramar na macaxeira (como diz a Deine).

Toda esta história é para falar do proprietário. O senhor de um metro e meio tem o olhar triste, é magro e chamado de baixinho – também pudera. Ele parece um homem de verdade, só que em miniatura. Inspira cuidados e uma profunda pena, de si e de seu empreendimento.

Assumo que só apareço por lá por causa do churrasquinho, cada dia mais gostoso. Os atendentes são uma graça, parecem que sempre estão bêbados e dificilmente esquecem meu pedido. A conta bem baratinha fecha uma refeição prazerosa.

Porém, nos últimos dias, venho percebendo um importante progresso: primeiro foram os pratos e talheres, todos novos; depois, um telão com projetor que exibe clipes musicais e jogos às quartas-feiras. Mas ontem, fiquei surpreso com uma nova churrasqueira, super moderna e com exaustor. E tenho a forte impressão que o progresso vai continuar.

Atento a isso, percebi que o baixinho – para mim, digno de pena – está progredindo e de vento em poupa.

Também percebi que existe uma importante diferença entre o meu pensamento sobre o baixinho e o dele sobre ele mesmo: eu tenho pena dele, ele não.

Ele não enxerga aquilo que, não sei por que, enxergo. Ele abriu um boteco, foi superavitário, investiu e continua investindo em seu negócio. Ele é feliz, atende bem, paquera as piriguetes que frequentam seu estabelecimento. Está vivendo e tocando a vida para frente.

É inegavelmente importante o que as pessoas pensam da gente, porém é fundamental nos conhecermos, sabermos de nossas virtudes e limitações, fazermos vista grossa para impressões negativas e colocarmos nossa energia na força do trabalho. Focar uma meta e se entregar a ela, ser feliz e alegre na conquista de sonhos democráticos.

Os sonhos do baixinho são democráticos. Ele não busca ser o homem mais bonito e o mais rico do mundo. Apenas 1% da população mundial tem esse nível de beleza e riqueza. Logo, o empreendedor tem 99% de chance de ser feliz.

Temos que realizar esses sonhos democráticos: trabalhar com competência, nos relacionarmos com amor e dormir em paz. O que não podemos é ter pena de nós mesmos.

4 comentários:

Deine Suruagy disse...

Poucos possuem essa sua capacidade de escrever de forma profunda e simples. Gostei muito deste texto. As histórias que retratam episódios de sua vida servem de contextualização das riquezas ocultas (às vezes, bem explícitas) nele impressas.

Tenho a honra de compartilhar alguns destes momentos com você e, inclusive, no esboço de pensamentos. Mas é certo que algumas frases apresentadas neste espaço ficarão marcadas, como essa: “É inegavelmente importante o que as pessoas pensam da gente, porém é fundamental nos conhecermos, sabermos de nossas virtudes e limitações, fazermos vista grossa para impressões negativas e colocarmos nossa energia na força do trabalho”... E essa, com a qual você conclui seu pensamento: “Temos que realizar esses sonhos democráticos: trabalhar com competência, nos relacionarmos com amor e dormir em paz. O que não podemos é ter pena de nós mesmos”.

Continue, por favor, continue...

Raimundo Feitosa disse...

Belo texto.
Depois de lê-lo descobri que sou admirador do "baixinho", gosto de "churrasco vagabundo" e preciso acreditar mais no potencial que Deus me deu.
Abraço

Demócrito disse...

Esse texto mostra com clareza de que somos realmente capazes e se tivermos paciência, perseverança e fé, conseguiremos tudo o que a vida puder nos proprocionar. Claro, não podemos deixar de lado a humildade que faz parte de grande parte do nosso sucesso, seja ele de caráter emocional, espiritual ou intelectual. Pensemos grande, como o baixinho aí da história. Ele quis, lutou e está recebendo o que lhe é merecido por Deus. Grande texto, Prof. Pael. Parabéns!

Christiany Borba disse...

Sem comentários, so parabenizá-lo pelos ótimos momentos de distração. Me sinto dentro de cada história aqui contata por você. Continue assim que não quero parar de ler rsrsr.

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