domingo, 27 de março de 2011 | By: Rodrigo Pael

O ambiente, o projeto e a meta

Em uma co-orientação de Trabalho de Conclusão de Curso, na Instituição em que trabalho, uma jovem aluna se mostrou triste por algum motivo específico, perguntador que sou, questionei o motivo da tristeza, sendo que o trabalho corria bem e a aprovação era certa, como se confirmou semanas depois, então ela me informou: ‘queria entrar no programa de mestrado da UnB, mas o prazo já acabou’.
Por vezes, percebo que pessoas de todas as idades apresentam uma estratégia clara de vida, mas com um objetivo ainda pouco definido, há os casos que o objetivo é extremamente bem recortado, mas o projeto de vida para atingi-lo está longe do ideal. Mas aqueles que me preocupam de verdade são os que não têm, nem estratégias e nem objetivos.
Não era o caso desta orientanda. Para testar a minha tese a questionei porque ela queria entrar no programa de mestrado, a resposta foi certeira e firme, como é de sua personalidade: “quero trabalhar em assessoria de imprensa, mas também quero dar aula de jornalismo.” Para os avaliadores mais apressados, a resposta não tem nada de excepcional, porém, posso garantir que tem.
Essa moça de menos de 22 anos tem um gigantesco patrimônio nas mãos, um objetivo claro e bem definido (trabalhar em assessoria e dar aula), e uma boa estratégia (fazer mestrado). Para descobrir o diferencial desta jovem é simples, pergunte aqueles ao seu redor, qual é o objetivo de vida que pretendem alcançar e como farão para obter êxito? Eu sempre faço isso com meus alunos e as respostas, em determinadas ocasiões, me preocupam.
Quando trabalhava em uma empresa de comunicação, comecei a conversar com a secretária do diretor, estava na ante-sala a espera de uma reunião, no meio do diálogo descobri que o sonho daquela recém formada jornalista era de ser professora no curso de jornalismo, fiquei feliz pela clareza de sua meta, mas quando questionei o que ela estava fazendo para conquistar tal objetivo, frustrei-me: “especialização em organização de eventos”.
Venho percebendo que a forte inclusão de pessoas de baixa renda no meio acadêmico  está proporcionando um fenômeno muito interessante: o primeiro membro da família com um curso superior. Esta criação de uma nova massa crítica é muito salutar, porém, por não conviverem em um ambiente de pessoas oriundas da academia, o próximo passo acadêmico e a formulação de planos para atingir metas, ficam comprometidos.
Para a minha jovem aluna teci meus comentários elogiosos e clamei para que ela não desistisse de suas metas. Já para a secretária do chefe, abusando da instantânea intimidade criada, a orientei a largar esta especialização e se esforçar para ser aprovada em uma pós-graduação stricto sensu. A especialização é voltada para aqueles que querem atuar no mercado em um segmento definido, para quem quer voltar para a academia, o caminho é o mestrado.
Independente de qual carreira seguir, o primeiro passo é se entender como um maravilhoso projeto que tem que dar certo. Para tanto, é fundamento se auto-conhecer, saber de suas virtudes e limitações, identificar qual diferença você quer fazer no mundo, dar nome a esta diferença por meio de uma profissão, estabelecer as estratégias, conversar com pessoas experientes e transformar cada minuto de seu dia um precioso e produtivo tempo para avançar.
Mãos à obra.
sábado, 19 de março de 2011 | By: Rodrigo Pael

Como convencer as paredes do quarto

Esta história aconteceu há anos, mas sempre me vem à memória quando percebo que aprendo muito observando este ente tão complexo, o ser humano. Era do meio para o final do ano e dois amigos meus estavam se preparando para prestar o mesmo concurso. O primeiro, já tinha prestado o concurso muitas vezes, e neste ano específico, estava mais empenhado que nunca, tinha passado na primeira das duas fases do certame e resolvera freqüentar dois cursinhos – um durante a semana e outro nos finais de semana – sua dedicação era tanta que, qualquer nova obra literária que aparecia na cidade sobre o assunto chegava primeiro na casa dele.
Este personagem anunciava aos quatro ventos os cursinhos que estava fazendo, sempre os melhores, e a bibliografia que já possuía em casa era invejável, dizem seus colegas que, na sala de aula, sentava-se na primeira fileira, sempre com uma caneta na mão e uma cara de conteúdo no rosto. Porém, um amigo do trabalho dele já me alertava, ‘a postura é inversamente proporcional ao repertório cultural’.
O segundo personagem se tornou um grande amigo, um homem que chama a atenção pela simetria e pela bela voz, mas aquele jeitão, não tão comprometido, estava me preocupando, também, ele só fazia o cursinho de final de semana. Ele é um ser diferenciado, aparenta ter muito menos idade do que realmente tem, e isso me causa óbvia inveja. Também prestava o concurso há anos, estava preocupado, estudando, mas o empenho demonstrado por nosso personagem anterior era visivelmente maior.
Passaram algumas semanas e o resultado da segunda etapa do concurso foi publicado, meu amigo que compõe o segundo personagem foi aprovado e festejou, já o, aparentemente, mais aplicado, não. A postura do reprovado foi de revolta com todos, criticou a prova, os elaboradores, os aprovados, o sistema solar, a lei da gravidade, dentre outros.
Avaliando a postura dos dois e, principalmente daquele que reprovou, me veio a mente milhares de imagens de situações onde obviamente eu, ou outras pessoas estavam tentando convencer o destino que merecíamos algo. Isto acontece quando adotamos uma postura assim, superlotando nossos horários de estudos estapafúrdios, comprando centenas de livros que não conseguiremos ler mesmo se tivéssemos duas vidas, fazendo caras e bocas de conteúdo, mas na verdade, temos graves limitações primarias de cultura e aprendizado.
Não estou criticando aqueles que, por algum motivo, não reuniram um repertório cultural importante, mas evidencio que não é com uma postura que o destino se convence. O destino é convencido por coisas reais. Não adianta ler grandes doutrinadores do direito, se ainda não conseguimos interpretar os códigos do português; não funcionará a tentativa de entender Guimarães Rosa, se não enxergarmos a complexidade mística da formação do povo brasileiro. Não adianta. Não é com posturas, faces e trejeitos, é com honestidade. É perceber em si que ainda tem limitações, que ainda não é um intelectual, mas que pode se torná-lo, se for verdadeiro consigo e com os outros.
Existe um verso do insuperável Raul Seixas, que sempre escuto vivamente em meus ouvidos, quando alguém tenta convencer o destino de algo: “convence as paredes do quarto e dorme tranqüilo, sabendo no fundo do peito que não era nada daquilo”.

sábado, 5 de março de 2011 | By: Rodrigo Pael

Do dente de ouro do próprio Deus à verba indenizatória

O meu melhor amigo é um jovem pastor batista, um teólogo inteligentíssimo que domina o assunto. Mesmo sendo católico apostólico romano praticante, sempre que tenho alguma dúvida religiosa, recorro ao Pr. Ludyney Claudino Moura para que, por meio de uma contextualização histórica, minhas inquietações sejam dirimidas.
No começo de nossa amizade, fiquei impressionado com uma história que corria nas redondezas do meu bairro, ‘um líder religioso que, de tão intimamente ligado a Deus, fazia nascer miraculosamente dentes de ouro na boca de fiéis que o seguiam’. Depois de convencido pelos relatos e pela veracidade dos acontecimentos – mesmo sem ter presenciado um caso – relatei o fato ao meu amigo pastor.
Ludyney ouviu pacientemente a história, e como um sacerdote experiente objetou: “mesmo que seja verdade, o que isto prova?”com esta indagação percebi a força de um discurso vazio. Sem significado prático mesmo no campo do místico, fui apresentado a bravata, foi conduzido a refletir sobre a falta de significado de um dente de ouro.
A mídia começou cobrindo os trabalhos legislativos impressionada com um dente de ouro. Com um discurso tão fácil como o do líder religioso que faz milagres sem substância Neste mês, parlamentares chamaram a atenção por não nomearem assessores, devolvendo a verba indenizatória e pregando uma falsa economia do erário público.
Eu, na juventude, impressionado com os milagres de um suposto ‘profeta’ é compreensível, mas a mídia encantada com essa vazieis retórica não tem nada de ingenuidade, mas sim uma ideologia liberal, falida e burra. O impacto desta política de um mandato minimalista é incrivelmente irrelevante e não colabora em nada com coisa nenhuma.
Caso todo o Governo Federal, os três poderes (Legislativo, Executivo e Judiciário) abrissem mão de todos os seus cargos comissionados faríamos uma economia de menos de 1% de tudo que o país arrecada, ou seja, irrelevante frente as atividades políticas de fundamental importância para a vida republicana e para a máquina administrativa.
No que tange as contratações de deputados e senadores e as verbas indenizatórias, um parlamentar que abre mão desses recursos terá seus trabalhos limitados e seus eleitores frustrados. No começo do ano que vem será possível avaliar o desempenho dos ‘arautos da ética’ e dos outros parlamentares. No endereço eletrônico da Câmara e em outros organismos de fiscalização terão dados tabulados que demonstram, em números, qual foi o desempenho do político eleito.
É possível quantificar quantos pronunciamentos seu parlamentar proferiu, quais bandeiras ele defendeu, quantos projetos de lei foram apresentados e quantos foram aprovados, de quantas comissões e frentes parlamentares o deputado ou senador faz parte e qual é a atuação deles nestes grupos suprapartidários.
É possível, por meio deste levantamento, verificar quanto em recursos foram destinados para os municípios, estados e Distrito Federal, e desses valores quantas creches, escolas, postos de saúde, praças, parques, hospitais, estradas, se tornaram realidade pela gestão política deste parlamentar.
Isso sim é verdade, melhora a qualidade de vida da população e é palpável, já a propaganda do trabalho simplista e franciscano de políticos apenas serve de discurso vazio para a reeleição, mais nada, algo tão importante quanto um dente de ouro.